quarta-feira, 27 de julho de 2011

Conflito na Líbia: Algumas breves considerações acerca da ação

internacional no país

Bruno Mendelski de Souza

As ondas de revoltas populares que estão ocorrendo no mundo árabe, e que já retiraram do poder líderes políticos que se encontravam há muito tempo nessa situação - Ben Ali na Tunísia (23 anos) e Hosni Mubarak no Egito (30 anos) - também chegaram à Líbia. Muammar Kaddafi governa o país há 41 anos e tem enfrentado fortes manifestações populares que pedem a sua saída do poder. Diante da forte repressão por parte do governo aos manifestantes, o Conselho de Segurança da ONU apressou-se em aprovar uma resolução condenando o conflito.

A resolução 1973, de 17 de março de 2011, solicita um cessar fogo imediato, estabelece uma zona de exclusão aérea e permite que “sejam utilizados todos os meios necessários para proteger os civis, com exceção de uma ocupação estrangeira em território líbio”[1]. Entre os membros permanentes do Conselho de Segurança, EUA, França e o Reino Unido votaram a favor da resolução, enquanto China e Rússia se abstiveram. Entre os membros não-permanentes, a Alemanha, Brasil e Índia também se abstiveram.

O Brasil condenou a violência na Líbia, mas rechaçou o uso da força como solução para o fim do conflito, entendendo que a diplomacia e o diálogo seriam ações mais eficientes nesse caso. A posição brasileira é coerente com o histórico de respeito à soberania e de pacifismo do Brasil. Segundo a representante brasileira permanente junto a ONU, embaixadora Maria Luisa Viotti, “não estamos convencidos de que o uso da força como dispõe o parágrafo operativo 4 da presente resolução levará à realização do nosso objetivo comum – o fim imediato da violência e a proteção de civis”[2].

Além do questionamento da eficácia de ações militares levantado pelo Brasil, a presente resolução do Conselho de Segurança da ONU também nos oferece uma interessante oportunidade para outras reflexões acerca das intervenções estrangeiras em assuntos internos dos Estados. O uso de violência contra civis é uma prática condenada em todo o mundo, gerando um dos raros consensos internacionais entre as nações. Porém observamos que muitas vezes as condenações sob esse tipo de situação, não acontecem de forma homogênea. Outros países que estão em situação de conflito em razão de revoltas populares e onde os governos também têm reprimido duramente os manifestantes (como no Iêmen e no Bahrein), têm recebido críticas mais brandas das grandes potências e não são cogitadas possibilidade de intervenção internacional.

Nessa linha o conflito em Ruanda em 1994, que deixou aproximadamente 800 mil pessoas mortas[3] é o mais expressivo exemplo: não houve por parte da comunidade internacional e da ONU, intervenções externas que visassem o fim dos combates. Atualmente, apesar de apenas dois meses de manifestações e de um com vítimas fatais, as Nações Unidas apressaram-se em votar uma medida que procura impedir a violência do governo contra a população; que indiretamente busca enfraquecê-lo politico e militarmente.

Apesar de ter melhorado sua relação com o Ocidente nos últimos anos, o governo de Kaddafi caracterizou-se por uma postura conflituosa e belicosa diante das grandes potências. Somado a essa situação, também nota-se que a Líbia é exportador mundial de petróleo, sobretudo para a Europa, além de possuir uma posição geopolítica estratégica, (próximo da Europa mediterrânea e do Oriente Médio). Dessa forma fica a questão: o uso da força internacional liderada pelas principais potências mundiais, e autorizada pela ONU, explica-se realmente apenas pela proteção aos civis líbios?



[1] O texto integral da presente resolução está disponível em: <http://daccess-dds-ny.un.org/doc/UNDOC/GEN/N11/268/39/PDF/N1126839.pdf?OpenElement>

[2] Intervenção da embaixadora Maria Luisa Viotti na sessão do Conselho de Segurança da ONU que aprovou a Resolução 1973. Disponível em:<http://www.itamaraty.gov.br/sala-de-imprensa/notas-a-imprensa/aprovacao-da-resolucao-1973-do-conselho-de-seguranca-da-onu-sobre-a-libia>

[3] Número divulgado pela própria ONU: <http://www.un.org/ecosocdev/geninfo/afrec/newrels/rwanda.htm>


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